Principais Áreas de Procedência dos Africanos


A questão da procedência dos africanos para o Brasil tornou-se bastante complexa, principalmente no tocante aos povos e etnias que forneceram os maiores contingentes de escravos.  A complexidade decorre da mentalidade colonialista dos portugueses que, não considerando o negro um ser humano, pouca importância davam a assinalar de maneira precisa, nos seus registros e documentos, as diversas culturas, línguas e grupos étnicos dos africanos capturados.  Ao contrário, estendiam a povos radicalmente distintos um mesmo nome, ou generalizações completamente sem fundamento.  Atualmente a antropologia tem revisto muito do que se escreveu sobre as origens culturais da massa escrava, no começo deste século, restando ainda muitos pontos a esclarecer.

A tradição historiográfica reúne, a grosso modo, os negros em dois grandes grupos étnicos: os bantos (ou bantus), da África equatorial e tropical, da região do golfo da Guiné, Congo e Angola, planaltos da África oriental e costa sul-oriental; e os sudaneses, predominantes na África ocidental, Sudão egípcio e na costa setentrional do golfo da Guiné.  Não há nenhuma prova definitiva da predominância de um desses grupos na composição dos negros vindos para o Brasil, embora se afirme normalmente que a maioria era de bantos.  Entretanto, as tradições culturais de alguns grupos sudaneses, como os iorubas da Nigéria, são amplamente predominantes nas heranças africanas da cultura brasileira.

Nina Rodrigues percebeu pela primeira vez a predominância sudanesa na Bahia, no que foi confirmado por Artur Ramos.  Este destacou no grande grupo a predominância dos iorubas, também chamados nagôs (embora esse nome seja normalmente estendido a outras etnias) da Nigéria, dos gegés (ewes) do Daomé, dos minas da costa norte-guineana, além dos tapas, bornus e galinhas; identificou a presença importante dos hauçás do noroeste da Nigéria, de influência muçulmana, a qual marcou também os fulas (mais claros, de origem berbere-etiópica) e os malês (ou mandingas, de tradição guerreira, considerados altivos e perigosos pelos lusos, que lhes atribuíam feitiçarias).  Entre os sudaneses originários da costa da Guiné, amplamente predominantes como vimos, a presença comum da língua pertencente ao grupo lingüístico ioruba talvez explique a predominância dos elementos dessa cultura em nosso candomblé e nas influências negras de nossa linguagem.

Havia sudaneses em outros pontos do Brasil, mas talvez houvesse uma predominância banto no centro-sul e no norte.  Artur Ramos indica como pontos iniciais de entrada das várias nações bantos os mercados de escravos de Pernambuco (extensivos a Alagoas), Rio de Janeiro (servindo a Minas e São Paulo) e Maranhão.  Entre os povos desse grupo, os mais importantes no Brasil foram os cabindas do Congo, os banguelas de Angola, junto com muxcongos e rebolos, e os negros de Moçambique que Spix e Martius chamaram de macuas e angicos.  A intensificação do tráfico de escravos para o Brasil no século XVIII, em função da mineração, multiplicou a presença de grupos originários da Costa da Mina e de Angola; no século XIX, até 1850, entrou também um número considerável de bantos da costa de Moçambique.
 


Do ponto de vista cultural, a influência dominante da cultura ioruba explica-se também pela sua predominância já na própria África, na região do golfo da Guiné, estendendo-se segundo Édison Carneiro até o interior do Sudão.  Sua civilização mais adiantada surpreendeu os primeiros europeus, pelos trabalhos em bronze que faziam no reino do Benim.  "A religião, a organização política e os costumes sociais de Ioruba davam o modelo a uma vasta zona.  Os negros de Ioruba eram principalmente agricultores, mas os seus tecelões, os seus ferreiros, os seus artistas em cobre, ouro e madeira já gozavam de merecida reputação de excelência.  Não havia abundância de animais de caça, mas a pesca, nos rios, nos lagos e no mar, rendia muito.  Criavam-se animais de subsistência - cabras, carneiros, porcos, patos, galinhas e pombos.  O cavalo era conhecido havia muitos séculos, devido ao contato com os árabes; o fundador do reino de Ioruba representava-se, nos mitos, montado num corcel." Vários dos deuses africanos cultuados no Brasil são procedentes de algumas de suas brilhantes cidades, como Oió.  Os nomes de alguns de seus reinos, como Ala Kêtu e ljexá, continuam como designativos de ritos de candomblé.

Quanto aos bantos de Angola, tinham uma agricultura mais primitiva, praticada pelas mulheres,  enquanto os homens criavam gado.  Diferentemente dos iorubas e outros sudaneses, que usavam tecidos  de pano, os negros das margens do Zambeze e das elevações de Benguela vestiam-se de cascas de árvores  (como o fariam no quilombo de Palmares); mais para o sudoeste, porém, usavam vestimentas de  couro, possuindo hábitos de caçadores e armas de ferro.


 
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Carneiro, Édison, "Ladinos e Crioulos," Civilização Brasileira, Rio, 1964 in Brasil História - Colônia / Antonio Mendes Juunior, Luiz Roncari e Ricardo Maranhão - São Paulo: Editora Brasiliensee, 1976.
Imagens publicadas em Brasil Revisitado: palavras e imagens / Carlos Guilherme Mota, Adriana Lopez. - São Paulo: Editora Rios, 1989.