Os holandeses


Durante as invasões e o domínio holandês, os escravos e negros em geral tiveram ativa participação nas lutas restauradoras. O seu comportamento não foi uniforme. Aqueles que assumiram uma posição radical negaram-se a participar dessas lutas. Fugiram para as matas, aproveitando as contradições reinantes, e organizaram quilombos, dos quais os mais importantes se confederaram e criaram a República de Palmares. Mas outra parcela de negros, escravos ou livres, aderiu ao movimento contra a permanência dos holandeses no Brasil. Nesse nível de consciência, o maior líder foi, incontestavelmente, Henrique Dias. Ele liderou negros de diversas origens, muitos deles pertencentes aos latifundiários escravistas, os quais se opunham, por interesse econômico, ao domínio batavo na colônia portuguesa.
 
Já na primeira invasão holandesa, ocorrida em Salvador, em 1624, os negros se comportaram bravamente diante do invasor. No início, os holandeses que ocuparam a cidade também organizaram militarmente os negros que decidiram ficar a seu lado. Segundo depoimento de Johann Gregor Aldengurgk, foram alguns destinados a trabalhar, e outros, armados de arcos, flechas, velhas espadas espanholas, rodelas, piques e sabres de abordagem, se organizaram numa companhia de negros, para capitão do qual foi escolhido um deles próprios, chamado Francisco.
Mapa das posições num combate entre holandeses e portugueses. BMSP.

A essa tática dos holandeses, recrutando negros evadidos, revidaram os portugueses com a máxima crueldade. Estes organizaram, por seu turno, os escravos de Salvador que não fugiram, para desempenharem funções militares na cidade sitiada. Nessa primeira invasão holandesa de Salvador (1624/1625), o negro participou das escaramuças quer de um lado, quer do outro, mas não teve um projeto de emancipação próprio.


Batalha de Guararapes. Victor Meirelles, EA.

Na segunda invasão realizada no Recife, os negros também atuaram, dessa vez mais prolongada e dinamicamente. Henrique Dias, conforme já dissemos, colocou-se ao lado dos latifundiários de Pernambuco e do governo colonial português. Foi um guerreiro eficiente. Lutou nas batalhas das Tabocas, feriu-se várias vezes e conquistou títulos honoríficos do rei de Portugal. Por outro lado, Calabar deu inúmeras vitórias aos holandeses, também demonstrou um alto espírito militar e grande capacidade de comando, tendo, em determinada fase da luta, feito virar os êxitos militares em favor dos batavos.
No entanto, Henrique Dias, após a expulsão dos holandeses, queixar-se-ia ao rei pela forma desrespeitosa e humilhante como ele e seus homens estavam sendo tratados pelas autoridades locais. Calabar, ao ser capturado pelos portugueses e brasileiros, é julgado e condenado à morte, não tendo os batavos feito nenhum esforço para livrá-lo do garrote vil.
Somente os negros de Palmares, que escolheram a via independente de luta, conseguiram auto-afirmar-se até 1695.

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História do Negro Brasileiro / Clóvis Moura - São Paulo: Editora Ática S.A., 1992