Autos
Forma teatral de enredo popular, com bailados e cantos, tratando de assunto religioso ou profano, representado no ciclo das festas do Natal (dezembro-janeiro). Lapinhas, pastoris, fandango ou marujada, chegança ou chegança de mouros, bumba-meu-boi, boi calemba, boi de reis, congada ou congos, etc. 
Desde o século XVI os padres jesuítas usaram o auto religioso, aproveitando também figuras clássicas e entidades indígenas, como poderoso elemento de catequese. As crianças declamavam, dançavam, cantavam, ao som de pequenos conjuntos orquestrais, sempre com intenção apologética. O Gênero popularizou-se. Para ele convergiram as danças dramáticas, algumas realizadas à porta ou adros das igrejas em Portugal, bailados com espadas, desfiles e apresentações corporativas, que participavam da procissão de Corpus Christi, bailados infantis, rondas, etc.
As origens não idênticas nem os estudiosos aceitam as hipóteses ou deduções oferecidas. 
Dos autos populares brasileiros o mais nacional, como produção, é o bumba-meu-boi, resumo de reisados e romances sertanejos do Nordeste, diferenciados e amalgamados, com modificações locais, pela presença de outros personagens no elenco. 
Outros autos vieram de Portugal, com alterações como a chegança de cristãos e mouros. Outros foram formados com elementos portugueses, música, versos, assuntos, mas construídos e articulados em todas as suas peças no Brasil, como o fandango ou marujada.
A origem erudita ligar-se-á, quanto aos autos de enredo religioso, aos miracles e mystères, estes saídos da liturgia das festas do Natal e Páscoa, e aqueles dos cânticos em louvor dos santos, materializações de cenas de suas vidas, populares desde o séc. XII na França, Inglaterra, Itália, Alemanha, etc. 
Em Portugal, os autos tiveram forma poética, sete sílabas (na contagem atual, octossilábica antigamente), redondilha, quintilha, com influência castelhana quase decisiva. O vocabulário, pura e rudemente plebeu, encantava o auditório e, mesmo com alguma polidez, Gil Vicente usava linguagem franca e sacudida. Terminava por uma dança simples, a chacota, e as árias ou cânticos se diziam vilancetes, de motivos religiosos da Natividade. Eram representados nas igrejas, adros ou mesmo no interior, nos serões da corte real, aguardando a missa do galo ou da meia-noite, Del-Rei Dom Manuel até D. Sebastião, quando o Santo Ofício tornou o ambiente irrespirável para o livre auto, com suas liberdades populares, que eternizaram a glória de Gil Vicente.
No Brasil as mais antigas menções informam que os autos eram cantados à porta das igrejas, em louvor de Nossa Senhora do Rosário (quando dirigidos por escravos ou libertos), o orago, ou na matriz. Depois levavam o enredo, com as danças e cantos, nas residências de amigos ou na praça pública, num tablado. Alguns autos reduziram-se a um puro bailado, sem assunto figurado, e se fixaram no carnaval, como o maracatu pernambucano, que não parece ter sido auto. Do perdido destino de festa votiva, reminiscência pura da coroação dos reis do Congo, o maracatu, mesmo carnavalesco, conserva a tradição de ir até uma igreja fazer reverência, antes de meter-se no frevo dos três dias do deus Momo.
 
Dicionário do Folclore Brasileiro - Câmara Cascudo, Rio de Janeiro: Ediouro Publicações S.A. sem data
 
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